FI
: E esse valor pode ser medido?
“A promoção de uma cultura
científica e do conhecimento
transformou claramente a
relação da sociedade portuguesa
com a ciência”
Claudio Sunkel
: Como já fui referindo,
existem muitas formas de medir a transfe-
rência de valor da ciência para a sociedade,
algumas facilmente mensuráveis, outras não
tanto. No que diz respeito à economia, o
retorno é relativamente claro, embora possa
ir mais além daquilo que se vislumbra numa
primeira análise. Há indicadores factuais,
como o número de empresas de base tecno-
lógica criadas, a inovação nos processos
produtivos, nos serviços e nos produtos, ou
o número de patentes que Portugal registou.
O desenvolvimento da sociedade como um
todo é mais difícil de medir. Mas se olharmos
para aquilo que era nos anos 80 e para o que
é agora, não temos dúvidas que mudou e
que mudou para melhor. A promoção de
uma cultura científica e do conhecimento
transformou claramente a relação da socie-
dade portuguesa com a ciência. Embora
ainda falte muito para que a sociedade por-
tuguesa passe a ter um nível de literacia
científica adequado, já muito se avançou e
é absolutamente essencial o papel que o
conhecimento tem no desenvolvimento da
nossa sociedade. O valor que decorre de uma
formação integral do indivíduo, em que a
ciência é um pilar fundamental, não se pode
calcular de forma exata, mas sabemos que é
indispensável para o futuro de um país que
se quer económica e socialmente sustentável.
Basta olhar para os países nórdicos, ou outros
pequenos países na Europa com décadas de
investimento no conhecimento, para perce-
bermos que essa é a única via para criar valor
sustentável nas economias modernas.
FI
: Como descreveria a última década de
ciência e investigação em Portugal, compara-
tivamente com outros países europeus e
com o mundo?
Claudio Sunkel
: A ciência Portuguesa evoluiu
imenso desde os anos 80, altura em que era
muito reduzida. Já atingimos a décima quinta
posição entre os países da UE e a trigésima
terceiraentreosmaisdesenvolvidosdomundo.
Todos os indicadores de produtividade e de
reconhecimento da ciência portuguesa são
comparáveis aos das melhores economias do
mundo, apesar do investimento em ciência
(1.41% do PIB em 2013) ser significativamente
inferior ao nível médio da comunidade euro-
peia (2.0% do PIB). Na verdade e em termos
comparativos, deveriam ser injetados com
urgência mais 500M€ no SCTN para estabilizar
emantertodoosistemaemfuncionamento.
Não existe nenhum país europeu que tenha
mostrado taxas de crescimento em todos os
parâmetros como Portugal apresentou nesta
última década. As críticas à qualidade e ao
desenvolvimento do tecido científico portu-
guês que as autoridades governamentais, e
algumas estrangeiras, têm feito recentemente
são, na minha opinião, totalmente infundadas.
Portugal é um exemplo de como um país
cientificamente muito atrasado consegue
recuperar em menos de 20 anos e se posicio-
na entre os melhores do mundo.
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FI n.º 54
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(cont.)